"Eu não quero acabar com a Halloween. Nossa ideia é reforçar a cultura do saci e não diminuir outras culturas", diz Guimarães, da ANCS.

Para o pessoal da ANCS, o Dia do Saci não deveria ser na mesma data que o Dia das Bruxas.

"Justificar uma data matando outra é inócuo, e acaba realçando ainda mais o Halloween", argumenta Guimarães.

"E por que acabar com uma cultura, seja qual for ela? Queremos aumentar a cultura do povo, e não diminuir."

Ele conta que até estudou um pouco de cultura celta e passou a explicar também sobre o Dia das Bruxas nos eventos dos quais participa.

E da mesma forma como defende que existam "associações de criadores" de lobisomens, de mulas-sem-cabeça, de curupiras, também iria aprovar a existência de uma entidade de criadores bruxas.

"Já temos muitos inimigos da cultura. Nosso folclore precisa se sobrepor à ignorância", ressalta Guimarães.

"Tudo é questão de contexto", relativiza Fraga, curadora da #OcupaSacy.

"Não lutamos contra o Halloween. O Halloween chegou ao Brasil da mesma maneira como muito da cultura americana chega ao Brasil. Tem um movimento antropofágico aí. A questão não é o Halloween. Vamos brincar o Halloween, toda brincadeira fantasiosa é muito legal. A questão é também ter o saci."

"Os mitos podem conviver", prossegue ela.

"E faz bastante mais sentido para nós a brincadeira do saci: é mais verdadeira no sentido de ter uma verdade histórica, uma relação com nosso povo que dialoga com nossas vivências."

O ex-deputado federal Chico Alencar defende que o resgate de figuras folclóricas é importante para o povo nacional.

"O saci é muito interessante porque recupera em sua figura a luta contra a escravidão, contra todas as formas de opressão. É importante para o fortalecimento da identidade nacional", diz.

Mas ele reconhece que, no dia 31 de outubro, o Halloween é mais forte.

"Nossa mentalidade colonizada e subalterna ainda prevalece. Portanto, a luta pelo reconhecimento e valorização do saci prossegue e ainda tem de vencer muitas etapas até se construir no novo imaginário popular", comenta.

"Instituições, governos e escolas contribuiriam muito para isso se tivessem essa preocupação, se valorizassem a figura simpática, incômoda, arteira e brincalhona do saci."

"Eu, particularmente, sou fã dessa figurinha: porque sem imaginação e sonho você não vive, ninguém é pura e dura realidade, exclusivamente. Mas o saci é a molecagem brasileira, é a resistência alegre a tudo o que algema, que controla e que paralisa."

Para o professor Pereira, especialista em Cultura Brasileira do Mackenzie, os grupos que se esforçam para resgatar figuras do folclore fazem um trabalho "fundamental e imprescindível".

"O folclore é o saber popular que se valoriza e que se perpetua ao longo das gerações. A história de qualquer país está intimamente ligada ao seu folclore, suas tradições, crenças e costumes", explica.

"Quem se interessa por isso com certeza sai enriquecido por inúmeros elementos que deram origem ao modo de pensar, agir e sentir do povo de quem descende. E pais, educadores e professores tem papel fundamental nesse processo."

Ele não acha que festas como o Dia das Bruxas precisam ser combatidas.

"Não sou refratário a introdução de outros elementos em nossa cultura. O Brasil sempre foi uma 'mistureba'. Antropofagia pura. O que me preocupa é que um elemento puramente comercial supere manifestações folclóricas, nascidas do imaginário popular e de tradições."

"E no meu entendimento pais e professores têm um papel fundamental na preservação de nossos valores culturais e de nossas tradições. Não é proibido o novo, mas não podemos esquecer o antigo", ressalta.

A solução, segundo ele, seria que temas relacionados ao folclore não fossem abordados apenas em datas comemorativas, mas que fizessem parte do dia a dia.

"Infelizmente, notamos que muitas escolas e professores ignoram a importância do folclore na criação da identidade cultural do país e acabam abordando o tema de maneira superficial", critica ele.

"Há que se abordar cada tema com sensibilidade suficiente para estimular a inteligência, a curiosidade e as emoções. Isso vai permitir um equilíbrio do aprendizado, um equilíbrio entre o velho e o novo, entre o real e o imaginário, entre o que é tradição e o que é produto comercial e principalmente, demonstrar que é possível fazer do passado um referencial de vida."

"O saci é a perfeita representação da miscigenação: índio, negro e europeu. Que o saci seja apenas um item introdutório na apresentação de outros elementos", vislumbra Pereira.

"O saci é uma figura anti-imperialista. Acho que se depender dele, vai mesmo comer a abóbora", resume Fraga.

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