sexta-feira, 2 de março de 2018

Competências e habilidades, vamos ler mais!


EDUCAÇÃO

Competências e Habilidades: você sabe lidar com isso?

Dra. Lenise Aparecida Martins Garcia
Profª. do Dept°. de Biologia Celular da Universidade de Brasilia

Competências e habilidades no currículo

Se o conceito de competências e habilidades não são unívocos, mais ainda varia o modo como estão sendo tratados na prática. Os PCNs, os currículos estaduais, outros documentos (como por exemplo os do ENEM e do SAEB) dão tratamentos diferenciados.
Um dos complicadores da situação, a meu ver, é que há uma mistura entre competências, habilidades e conteúdos conceituais. De fato, a competência, para ter a mobilidade que a caracteriza, não pode estar associada a nenhum conteúdo específico. Entretanto, admito que é muito difícil organizar um programa ou currículo sem fazer essa associação.
Vejamos um exemplo:
Os PCNs do ensino médio apresentam competências e habilidades em conjunto, sem definir o que seria competência e o que seria habilidade. Dada a amplitude destes termos, considero o tratamento correto. São apresentadas de um modo bastante genérico, caracterizando a mobilidade. Algumas delas, do documento de Ciências Naturais e suas Tecnologias:
  • Desenvolver a capacidade de questionar processos naturais e tecnológicos, identificando regularidades, apresentando interpretações e prevendo evoluções.
  • Utilizar instrumentos de medição e de cálculo. Procurar e sistematizar informações relevantes para a compreensão da situação-problema. Formular hipóteses e prever resultados.
  • Reconhecer o sentido histórico da ciência e da tecnologia, percebendo seu papel na vida humana em diferentes épocas e na capacidade humana de transformar o meio.
  • Entender o impacto das tecnologias associadas às ciências naturais, na sua vida pessoal, nos processos de produção, no desenvolvimento do conhecimento e na vida social
Entretanto, para desenvolver essas competências será necessário que elas sejam trabalhadas em conexão com algum(ns) conteúdo(s) conceitual(is). Os currículos estaduais estão em geral refletindo essa associação. Vejamos alguns tópicos (classificados como competências) do currículo do distrito federal:
  • Identificar a célula como unidade responsável pela formação de todos os seres vivos, não existindo vida fora dela.
  • Explicar os processos de transmissão das características hereditárias e compreender as manifestações físicas e socioculturais delas.
  • Compreender que as espécies sofrem transformações ao longo do tempo, gerando a diversidade, segundo seleções, adaptações e extinções.
Como podemos perceber, ao fazer-se a combinação competência / conteúdo conceitual perdeu-se a mobilidade. Entretanto, isso não quer dizer que não se possam desenvolver, por esse caminho, competências móveis. Por exemplo, aqui se fala das manifestações físicas e socioculturais ligadas à transmissão das características hereditárias. Se forem trabalhadas também manifestações socioculturais em outros aspectos da ciência, ao longo do currículo, a competência de detectá-las e compreendê-las em diferentes situações estará sendo construída.
Penso que ainda temos muito o que aprender quanto aos modos de expressar e principalmente de desenvolver competências e habilidades como objetivos de ensino e aprendizagem. Certamente, terá que ser uma construção coletiva.
É também Perrenoud quem diz que "construir uma competência significa aprender a identificar e a encontrar os conhecimentos pertinentes". Por isso, "se estiverem já presentes, organizados e designados pelo contexto, fica escamoteada essa parte essencial da transferência e da mobilização".
Do ponto de vista prático, isso significa que é necessário que os alunos descubram os seus próprios caminhos. Quanto mais "pronto" é o conhecimento que lhes chega, menos estarão desenvolvendo a própria capacidade de buscar esses conhecimentos, de "aprender a aprender", como tanto se preconiza hoje.
Levada ao extremo, essa concepção tornaria desnecessária - e mesmo prejudicial - a atuação do professor. Entretanto, não é essa a interpretação que damos. O professor tem que reconhecer, isso sim, que o ensino não pode mais centrar-se na transmissão de conteúdos conceituais. Ele passa a ser um facilitador do desenvolvimento, pelos alunos, de habilidades e competências.


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