Mentalidades Matemáticas usa objetos manipulativos para engajar adolescentes
A aula de Matemática do 7° ano do Ensino Fundamental do Colégio Sidarta, escola de aplicação do Instituto Sidarta, em Cotia (SP), é sobre análise combinatória. Divididos em grupos, os alunos têm o desafio de descobrir diferentes combinações, usando para isso placas de carros, com repetição ou não de números e letras. Munidos de ideias, conversas e canetas coloridas, os jovens preenchem seus cartazes. Após 30 minutos, um aluno de cada grupo vai à frente da sala e descreve à classe como chegou ao resultado. Começa então um animado debate sobre as estratégias apresentadas.
“O que mais interessa são os diferentes processos que eles fazem para chegarem ao resultado”, afirma a professora Maitê Salinas. Construções coletivas, as aulas do Programa Mentalidades Matemáticas buscam incentivar a criatividade dos estudantes e a profundidade em suas análises. A aluna Alice Schalka, 13 anos, vai à lousa explicar a estratégia de seu grupo para chegar ao número de combinações de placas de carros possíveis sem repetir letras e números. Em seguida, dois colegas de outra equipe assumem seu lugar e, de forma serena, apresentam sua solução, diferente da anterior. Não há observações críticas ou julgamentos. “Eles são muito cuidadosos quando percebem que existem outras estratégias. Observam outros caminhos e não os desvalorizam, até que chegam a um acordo.”
Um outro aluno observa um erro bobo que passaria despercebido em uma multiplicação simples apresentada no quadro. Vai até o grupo e sutilmente pergunta: “Gente, o valor é este mesmo?” As meninas percebem e agradecem.
O desafio das placas de carro é a quinta aula no processo de aprendizagem de análise combinatória. Um processo dado pela investigação, desenvolve o raciocínio lógico, a curiosidade e a argumentação. A sequência começa com exercícios de matemática concretos e visuais, usando combinações de cores e blocos, como o “desafio da torre de 3 blocos”. Quantas torres diferentes é possível construir com 3 peças, uma de cada cor?
Nas aulas seguintes, aumenta o número de cores e blocos, até que os materiais recebidos não sejam suficientes para criarem todas as possibilidades de torres. Então eles conheçam a pensar em estratégias para abstração – com mais andares de torres e blocos, que cálculos facilitariam suas resoluções -, fazem seus registros de forma organizada, valorizando todo o processo do grupo, desde as hipóteses iniciais até as conclusões.
Para as apresentações, utilizam desenhos, tabelas, fórmulas e esquemas. Com isso, estimulam diferentes regiões cerebrais, como mostra a pesquisa baseada em Neurociência e Matemática desenvolvida por Jo Boaler, professora da Universidade Stanford, nos EUA. Isso torna o aprendizado mais profundo e significativo, fazendo com que os alunos percebam muitas relações.
“Faço perguntas, valorizo o potencial, os estimulo e conduzo no próprio caminho para chegarmos enfim à um acordo. Procuro fortalecê-los, quero que se sintam matemáticos também”, explica Maitê. “É um início concreto e visual, os alunos conseguem desenhar suas estratégias. Quando aumentam as possibilidades, eles percebem os limites do desenho e partem para a abstração. Hoje, como já desenvolvemos juntos há três anos trabalhos em grupo e atividades desafiadoras, de ‘piso baixo e teto alto’ – como define Jo Boaler – este grupo já está bem avançado. Estão trabalhando uma habilidade que seria já referente ao 8º ano, e muitos chegaram a conclusões apresentadas só no Ensino Médio. É muito rápida essa transposição para o abstrato.”
A aula das torres de blocos foi idealizada pelo Youcubed, plataforma online do Mentalidades Matemáticas desenvolvida por Jo Boaler. Você pode encontrar a atividade aqui. O desafio das placas é uma adaptação do Instituto Sidarta. Maitê acredita que, se começasse com o exercício sobres as combinações de placas direto, os alunos talvez não se engajassem tanto, porque não teriam o conhecimento construído de forma tão coletiva, criativa e significativa. Com a matemática visual, constroem o pensamento com mais segurança.
A estratégia de cada grupo para chegar ao resultado é uma construção coletiva. Em seus grupos, eles debatem internamente o processo e o cálculo. Para manter o engajamento, cada aluno tem suas próprias responsabilidades na equipe, seguindo princípios da pesquisadora Rachel Lotan, da Universidade de Stanford. O Facilitador esclarece a atividade; o Harmonizador encoraja o consenso, garante que as ideias sejam ouvidas e mantém o grupo unido para que desenvolvam a atividade; o Monitor de Recursos é responsável por gerenciar os materiais de que o grupo necessitará; e o Repórter e apresenta o relatório final à turma.
A professora mantém seu papel de mediadora, incentivando o debate entre os alunos sobre a estratégia preferida e o resultado acordado. “Na maioria das vezes, chega-se ao resultado correto pelo consenso. Não preciso ensinar um jeito , ou o meu jeito. Os alunos são muito capazes, não podem ficar presos a um só método. Precisam de liberdade, sentir que confiamos neles, para encontrar seus caminhos matemáticos”, completa Maitê.
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